Isabella Isabella Isabella



É engraçado virar um adulto. Quer dizer, nem sempre é engraçado, mas revisitar alguns lugares da infância e da adolescência são impressionantes com o passar dos anos.
Há uns meses atrás encontrei uma menina que não encontrava há muitos anos. Nós estudávamos juntas no mesmo cursinho de inglês do bairro. Ela devia ser uns dois anos mais velha do que eu.
Eu ficava extasiada quando ela aparecia nas aulas. Ela gostava de desenhar - como eu - e me ensinava sites diferentes para montar personagens e me dava dicas de músicas. Ela era muito diferente e especial.
Me lembro um dia, em particular, que ela me emprestou uma caneta linda azul metálica. Eu adorava canetas coloridas. Escrevi incontáveis vezes, no meu caderno, o nome dela. Só isso, em repetição.
Eu achava ela absolutamente esplêndida. Os cabelos longos cacheados até a cintura, uma voz anasalada. Ela falava devagar e tinha uns olhos que iam fundo.
No dia que encontrei ela, há alguns meses atrás, meu coração disparou meio estranho. Fazia tantos anos! E assim que eu a vi eu pude entender: eu era apaixonada por ela.
Não sei quando foi isso, se eu tinha 11 ou 12 anos. Sei que foi mais ou menos quando fiz uma melhor amiga muito especial na escola.
Ela era de outro estado, muito sorridente e engraçada. Era leve e espontânea. Eu tinha vontade de grudar nela e nunca mais separar.
Eu sempre fui uma pessoa carinhosa, mas acho que comecei a perceber que ela se incomodava com os meus toques.
Não sei exatamente o que aconteceu, ela se mudou de novo pro seu estado de origem, acho, mas eu fiquei um pouco chateada porque ela parou de dar notícia e saiu da minha vida.
Muitos anos depois encontrei ela nas redes sociais de cabelo muito curto e com um visual bem específico e pensei: Oh meu deus, é claro. Eu também era apaixonada por ela!

O engraçado de ser uma pessoa bissexual é que a bissexualidade vem meio caladinha, tímida.
As primeiras pessoas que eu me apaixonei na vida foram mulheres.
Meus primeiros desejos sexuais foram por mulheres.
Dois anos depois de ter dado meu primeiro beijo (em um homem) eu já estava beijando mulheres com naturalidade, como se sempre fizesse parte da minha sexualidade (e sempre fez).
Mas só há cinco ou seis anos atrás eu consegui me perceber como bissexual de verdade. E levantar a bandeira ainda é difícil.
Eu já amei muitos homens. Eu gosto muito deles, também. E acho que por isso foi tão fácil todo esse tempo. Por isso que não conseguia me assumir verdadeiramente - tirando o fato de que ficar com homens é bem mais fácil e menos trabalhoso do que com mulheres.

Ainda hoje descubro coisas enterradas na minha formação sexual. Quando percebo essas coisas sinto vontade de rir e penso: nossa, é claro que era isso.
A consciência que adquirimos mais velhos é muito bonita e importante. São coisas que nem percebemos, assim como sentimentos que nossos pais transmitiam para nós, que pensávamos ser bobeira, mas hoje sentimos latentemente.
Amadurecer é também perceber o que faz parte de você. E, nossa, Isabella com certeza faz.

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