Articles

Affichage des articles du 2014

Délinquance

Image
Cheguei na sala dos professores e um coroa falava, meio puto: - Esse menino é traficante. Não entendi porque ele está aqui. Fui perguntar e me disseram que foi porque o juiz mandou, que ele estava em observação e precisava estudar. Eu não dou aula pra bandido! Ele não faz nada, fica com fone de ouvido a aula toda. Não quero, não quero, não quero bandido na minha sala. Ele olhava pra mim de vez em quando. Não disse nada mas também não tirei os olhos dele. Minha cabeça borbulhava. Os outros professores, uma mulher de quarenta anos com um microfone e caixa de som portáteis pendurados na cintura, outro, um senhor de uns sessenta anos que parecia meio nervoso, e o professor que me acompanha - Zé Mauro -, de quase sessenta também, que quando notou minha expressão (ou falta de) e os olhos vidrados, disse logo: - Acho melhor irmos, né. Não sei se adiantaram a aula da 701. Levantei. Disse algo como "tudo bem" ou "vamos lá" e saí. O professor que falava do aluno trafic

La haine

Image
Você me irrita quando beija minha coluna vértebra por vértebra me admirando a cada milímetro Você me corta a carne quando lambe meus seios devagar, me faz sangrar de tão tenro Você me enche de hematomas quando me abraça forte me sufoca até quase desmaiar Você comprime minhas vísceras me rasga sem pudor quando me olha, de surpresa e me admira continuamente Você queima minha derme me faz chorar de ardência e me maltrata inteira de tanto amor

Chair de Poule

Image
Eu adoro quando os mamilos ficam rígidos sob a camisa. Quando os pêlos se levantam arrepiados no braço e na nuca. Quando um pequeno calafrio se agita e engrandece por todo o meu corpo. Quando eu sinto o couro cabeludo se mover rapidamente. Eu penso em um milhão de coisas ao mesmo tempo - e em nada, também -, sinto a energia se esvair de mim, as pontas dos dedos tocam a pele. Devagar, suavemente. Quase um orgasmo: silencioso, tranquilo, secreto. No ônibus, na rua ou mesmo enquanto escrevo isso pra você. É meu corpo que diz: você é linda, garota. Você é maravilhosa, deixa eu te tocar, deixe-se curtir.

Le[s] coeur[s] brisé[s]

Image
- Quer saber? Que se foda você! Bateu a porta forte e a deixou do lado de fora. Estava um frio da porra e Maria estava com um casaco de lã, mais nada por baixo. O sangue subiu e não deu pra congelar no corredor mas talvez um choque térmico possa ter acontecido nesse momento; relaxou os músculos do corpo e contraiu os da face. Tudo errado. Sentiu o nariz esquentar como se fosse chorar mas não precisou fazer muito esforço pra que as lágrimas não caíssem. O corpo captou. Julieta já tinha se trancado no quarto e enfiado a cabeça no travesseiro. Três meses pra isso? Esperou três meses pela notícia - ao vivo - de que estava tudo perdido? Ela tinha se convencido de que já não tinha nenhuma expectativa, mas quando Maria ligou naquele dia de outono dizendo que estava voltando seu coração parou por meio segundo - ela sabe - e algo cresceu nela. O papo não pôde continuar porque ela disse que o tempo estava acabando e não tinha mais moedas para botar no orelhão. Achou normal, afinal ela

Piqûres

Image
Prefiro o som do vem, não vem Que o tato móvel, ignóbil Rêvée que je t'as mangé a commencer par tes lévres Les petites piqûres pour s'adapter Me tinha em ti Me embrulhei e até Sumi

L'air

Image
Enchi o pulmão e dessa vez consegui soltar o ar. Quase todo, também não dá pra querer tudo de uma vez. Senti um alívio imediato, tirei aquele aperto do peito, consegui sentir meu corpo como meu e só; sou sua única dona. Não que eu não goste de dividir ele com outras pessoas, mas, acredite ou não, agora que soltei as amarras do ar que me prendiam - assim, por dentro - me sinto mais capaz de me doar. Só então consigo regular o que entra e o que sai. Escolho o quanto inspiro, o quanto expiro, quando prendo a respiração - e como prendo! -, mas também quando solto com força, desafogando o diafragma e livrando os ombros. E tudo isso é muito engraçado porque, não sei como, desde que consegui me desamarrar, alguma coisa em mim só atrai felicidade e gratidão. Acho que, com a falta do ar, veio a plenitude da luz: que me integra por dentro e me faz inteira. Dessa vez sem dor nem peso.

Doute

Image
O sol que queima invade e o peso do tempo nas costas - a melanina - o fardo, pesado a cor da folhagem um suspiro ambíguo a passagem do vento raso escasso e o que sobra é dúvida o embrulho do coração a revolta da razão embaralha os sonhos e o peso, que desgasta os ombros